Após receber as chaves do quarto na recepção,
logo na entrada principal, Alice conseguiu visualizar completamente aquela que
seria sua nova morada. Avistou um pátio amplo, com imensa área verde e florida,
ornamentado ao centro com uma imagem magnífica da santa padroeira da
instituição.
Olhou para as longas alamedas, com colunas
largas, típicas de antigas construções, e enquanto caminhava foi analisando os quadros
e placas comemorativas dispostos nas paredes, como estações de uma via sacra que
terminou diante da porta do quarto trinta e três.
No entanto, ao invés de entrar, decidiu
atender ao badalar do sino que anunciava o almoço e dirigiu-se ao refeitório.
Acreditava que seria uma bela oportunidade para apresentar-se e fazer amizades.
Mas a ilusão logo se desfez...Constatou, observando pelas janelas entreabertas,
que a maioria das hóspedes comia em suas acomodações, com o auxílio de
funcionárias da casa.
Foi
então que percebeu que era exceção ali, pois a despeito do déficit visual
causado pela catarata que teimou em não corrigir, estava lúcida e saudável nas proximidades
de seus oitenta anos de vida.
Após o almoço, foi até a capela, e
contemplando o Santíssimo, pediu a Deus, como de costume, guarda e proteção aos
filhos e netos. Guardava no coração a certeza de que em quinze dias, no seu natalício,
os filhos reconsiderariam a decisão de deixá-la aos cuidados de um abrigo e
voltariam saudosos para resgatá-la. E assim, mais fortalecida, voltou ao
quarto.
Dedicou toda a tarde para a organização dos
objetos e lembranças diversas que couberam na mala. Ao anoitecer, passou a
chave na porta e trancou-se ali, por longo tempo, solitária, repassando a vida
limpo...
“Mesmo
quando tudo pede um pouco mais de calma / Até quando o corpo pede
um
pouco mais de alma/ A vida não para...”
Paciência,
Lenine.