O espaço
escondido atrás da sala de reuniões e em desuso há vários anos foi escolhido
para abrigar o horto medicinal da unidade de saúde. E apesar do desafio em
revitalizar aquele lugar tão deteriorado e sujo, o projeto encontrou solo
fértil no coração da enfermeira.
O
pavimento incompleto, com mato alto, disfarçando o pequeno limoeiro, os restos
de material elétrico e hidráulico descartados e entulhados após quebra ou
defeito, e a desordem causada pelos gatos que frequentavam o lugar foram desaparecendo,
e finalmente surgiu a terra que serviria de berço para as plantas que estavam
por vir.
A remoção dos blocos de pedra causou
transtorno, fazendo uma fina camada de areia adentrar na unidade e cobrir as
autoclaves. E ela foi chamada a responder por isso, prometendo solucionar o
problema com o plantio das mudas. Naquele momento, percebeu que o projeto, que
a princípio não era de sua autoria, era agora atribuído a ela, e não havia mais
como se omitir...
Na manhã seguinte, mesmo de folga,
recebeu inúmeros telefonemas questionando sobre a entrega de um material de
construção na unidade, que associaram a reforma do espaço para o horto, e
conseqüentemente, ao nome dela. Desfez o equívoco, e passou por outros incontáveis
dissabores, transferindo por completo a responsabilidade com o horto medicinal
para uma colega.
Dedicou-se a regar seu sonho de ser
aprovada no doutorado, trabalhando com afinco para conquistar a única vaga
oferecida para sua orientadora, amiga de toda a vida. Mas, entre as leituras
científicas, lá estavam buscas sobre fitoterápicos e hortos medicinais,
evidenciando que o desejo de concluir aquele feito já estava enraizado, e após
a aprovação no processo seletivo, voltou a ser a força motriz do projeto.
Com a ajuda financeira dos colegas e o
trabalho de sua equipe, providenciou a pintura das paredes e construção dos
canteiros, e, em uma atitude de coragem e ousadia, inscreveu o projeto em uma
mostra regional de trabalhos, sendo selecionada, de forma surpreendente, para
uma apresentação em nível municipal.
Para a consecução das mudas, visitou duas
instituições, e trouxe as plantas em carro próprio para o posto de saúde.
Aguardou alguns dias, e como não houve qualquer mobilização para o plantio, no
intuito de não desperdiçar as plantas, reuniu sua equipe e foi pessoalmente tratar
de fazer o horto aparecer de fato, dividindo-se entre seus atendimentos em
consultório e o plantio durante toda uma
intensa manhã de sol.
O resultado final ainda não saiu como
esperado. Na verdade, estava bem aquém do que ela planejou. Porém, foi
suficiente para ela preencher os slides da apresentação com fotos e exibir todas
as etapas do processo em público, orgulhosa por chegar até ali.
Hoje, quem visita o lugar, vê mudas de babosa,
capim santo, malva, cidreira, dentre outros tipos de plantas. Os tijolos
retirados do antigo piso ainda fazem pilha ao lado do local que servirá um dia
como composteira, um espaço de armazenagem do adubo que será produzido na
própria unidade, como deve ser. Ela, no entanto, quando olha ao redor, vê que
sua determinação e força de vontade podem fazer crescer e florescer coisas
belas, enchendo de cor e beleza, até mesmo os terrenos mais áridos.
"As pessoas se convencem de que a sorte me ajudou, mas plantei cada semente que o meu coração desejou..." Coração Pirata, Roupa Nova.